23 de dez. de 2025

CICATRIZ E VOTO

 

Imagem gerada por Gemini

Mais um ano se esgota, carregando nas costas o peso dos dias. Um ano difícil, dizem todos… e é verdade. Mas o que o dificulta não são somente as crises que se acumulam, mas a névoa espessa de hipocrisia que as envolve. Falamos de futuro com a língua afiada do passado. Prometemos renovação com os mesmos gestos gastos.

Eis que se aproxima um novo ciclo, com seu ritual inevitável: as eleições. A esperança, frágil e teimosa, reaparece nas esquinas. Será que desta vez…? 

A pergunta paira no ar, entre a fé e o ceticismo. É preciso cuidado. A tradição aqui não é apenas a do samba, do futebol ou da hospitalidade. É também a tradição do golpismo, às vezes sutil, às vezes escancarado, que ressurge em novas roupagens, em novos discursos. 

É o hábito antigo de sabotar a vontade das urnas quando ela não serve aos interesses de sempre.

Não se trata de pessimismo, mas de lucidez. Conhecer o terreno em que se pisa não é desistir da caminhada; é escolher melhor o próximo passo a seguir. Até porque, a armadilha clássica é acreditar que a história é um conto moral, onde os bons triunfam por pureza. Mas a política real é mais complexa: um tabuleiro onde forças se movem, pactos são feitos e retrocessos são planejados nos bastidores, também.

A hipocrisia do momento está em negar essa realidade constante, em vender soluções mágicas ou salvadores messiânicos. Enquanto isso, as estruturas que permitem o "golpismo" — a desigualdade brutal, a desinformação fabricada, a justiça seletiva — permanecem intocadas.

Portanto, ao entrar no novo ano e no novo ciclo eleitoral, a atenção deve ser redobrada. Não cair novamente na armadilha do "é agora ou nunca". Enfim, não confundir o canto de sereia da polarização com debate político. Desconfiar de quem pede sua confiança total e seu pensamento crítico em troca.

Lembre-se: a verdadeira resistência à tradição golpista começa com a memória. Lembrar o que já foi feito, quem já traiu, quais mecanismos já foram acionados para subverter a democracia. E partir dessa memória para construir, com frieza e paixão, um futuro que não repita os mesmos erros.

Que o ano novo nos encontre menos ingênuos, mais unidos no essencial e absolutamente determinados a não entregar o jogo antes mesmo de ele começar. O risco é constante, sim. Mas a possibilidade de desarmá-lo, essa também é uma tradição que vale a pena cultivar... e isso, sim, a gente não pode esquecer.