Eu não sou
religioso. Penso que nunca fui. No entanto, fui batizado, catequizado. Isso é
fácil de entender. Estudei o antigo primário em colégio de freiras. Todas elas
usavam o antigo hábito preto, a gente nunca via seus cabelos, por exemplo, se
eram loiros, castanhos ou pretos, mas quase sempre o olhar revelava um sorriso
simpático a nós.
Então, fiz a
primeira comunhão e tomei todo cuidado para não morder a hóstia, não sangrar o
sangue de Cristo em minha boca (assim me alertaram os amigos). No mais, foi
tudo tranquilo. Na escola, tinha todas as matérias como todo colégio laico,
exceto a matéria de religião católica como parte do currículo, mas não
reprovava o aluno, a menos, claro, se não houvesse presença em sala de aula, no
caso, havendo elevado número de faltas. Isso nunca acontecia. A professora era
uma jovem freira um tanto rebelde, lia provavelmente, escondida, secretos
livros de filosofia como nós. Sabíamos disso porque, antes de falar dos
pensamentos de Sócrates, Platão, Espinoza, etc., ela sempre tomava o devido
cuidado de abrir a porta para ver se tinha alguém nos espiando pelos
corredores. A turma ficava em silêncio, em suspense, aguardando…
Bem, hoje
sou adulto, sou velho, e já esqueci quando foi a última vez que entrei em uma
igreja. Faz tempo, isso sei, faz muito tempo mesmo. No entanto, hoje aceito
todas as religiões sem escolher nenhuma delas como estimação, talvez porque
tenho agora consciência dos seus dogmas, suas crenças. Hoje elas se parecem
como o ato de trocar de blusa, de camisa, conforme a ocasião. Não importa. Com
a filosofia aprendi que a vida e o corpo são mais sagrados do que toda a
roupagem.
Por isso, acho uma grande bobagem o que vem acontecendo no Brasil: um país que acolhe todas as religiões do mundo sem discriminação, quer dizer, pelo menos é o que consta na constituição federal. Portanto, vejo com preocupação todo esse ódio religioso misturado com ideias políticas…
Sabe, às vezes sinto saudade daquela freira lá da minha infância, minha primeira professora. Ela era tão tranquila, sorridente, simpática, e quando ela falava de filosofia, seus olhos se acendiam brilhantes, que eu até acreditava que ela era uma filósofa disfarçada de freira!