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O ESPECTADOR SILENCIOSO.
Observo, atônito, o mundo que construímos desde os tempos idos. Uma
sinfonia caótica de fumaça e concreto se mistura. Até parece que a natureza
também chora em silêncio por saber que o futuro se esvai em uma névoa quase
imperceptível, assim como também me sinto um mero espectador, mais uma
testemunha impotente de um espetáculo macabro que a humanidade encena a si
mesma.
Lembro-me da minha infância, quando a brisa sussurrava segredos nas folhas das árvores e o sol aquecia a pele como um abraço materno e acolhedor. A terra era um lar vibrante, cheio de cores e sons, um paraíso onde a vida pulsava em cada canto do mundo...
Sim, mas com o tempo, essa melodia celestial foi
substituída por dissonâncias ensurdecedoras. Ao mesmo tempo, esse mesmo mundo
passou a se empolgar com as invenções e com o surgimento das indústrias.
Trocamos a pureza das águas por mares de plástico, o
verde-esmeralda das florestas por desertos áridos, o canto dos pássaros pelo
rugido dos motores. Descontrolados, continuamos abrindo as feridas na terra, ignorando seus gemidos de dor,
agora mais cegos pela ganância e o egoísmo, enfim, quem se importa com isso, deixemos, então, a 'batata
quente' nas mãos das futuras gerações…
Sim, sou parte dessa história de sermos mais ágeis, dinâmicos, científicos, mas também sei que sou um minúsculo pontilho alinhavado nesse longo tecido de destruição, mais uma insignificante e minúscula roldana fazendo parte dessa engrenagem maçônica do sistema de
consumo. Utilizo os mesmos produtos que poluem, respiro todo esse ar
contaminado, e ando pelas ruas asfaltadas sufocando a nossa vida. Sinto-me
cúmplice, mais um espectador silencioso que observa o colapso avançando e também fico sem
agir, fico apenas observando.
Sei que a minha culpa não apaga o fogo, nem replanta as árvores, nem
devolve a vida aos animais extintos. Ela apenas me paralisa, sinto-me
anestesiado pela grandeza e conforto da tecnologia e me torno cada vez mais esse
observador passivo da tragédia que se desenvolve vorazmente em torno de mim.
Então, consternado, em meio a essa escuridão, a essa penumbra fria, tento buscar uma
faísca de esperança jaz apagada dentro de mim. Sinto-me tão-só, tento ainda encontrar
pessoas que me resgatem desse esquecimento, dessa letargia de ser apenas um mero espectador.
Talvez elas já estejam até lutando por um futuro melhor, diferente, quem sabe
até por um futuro onde a harmonia com a natureza seja imperiosamente
importante. Sim, quiçá já estarão plantando árvores, limpando os rios, defendendo
os animais, educando todas as crianças sobre a importância do planeta, sim, outro solitário e minúsculo pontilho vagando igualmente nesse imenso tecido do cosmo, como
eu, aqui, também, divagando em silêncio, somente tão-somente observando o céu.
Talvez, a culpa que sinto hoje se transforme em uma esperança, amanhã.
Pode ser que eu ainda acredite que, um dia, possa enxergar que fui mais do que
um mero observador silencioso, que fui parte da busca pela solução, um fio de luz na
corrente da mudança. Mesmo que meu ato seja minúsculo, invisível, no entanto saberei que não era somente mais outra parte da engrenagem anterior.